por Cristiane Collich Sampaio, Denise de Almeida e Márcia Alves


 


A saída da maioria das multinacionais do segmento de distribuição brasileiro e a recente criação da joint venture envolvendo a Shell – única marca internacional a permanecer nessa atividade no Brasil – e a Cosan-Esso mostra tendência de concentração de mercado em poucas e poderosas empresas. Mas esse movimento não parece preocupar órgãos de controle da concorrência, tampouco dirigentes de entidades de segmentos envolvidos.


Em março de 2010, de acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), 202 distribuidoras estavam autorizadas a comercializar combustíveis no país. A BR continua em primeiro lugar no ranking brasileiro, seguida pela Ipiranga e pela Shell-Cosan, todas megaempresas. Distância considerável as separa da ALE, que está na quarta colocação. Somadas, essas quatro empresas respondem por cerca de 80% do mercado de combustíveis, segundo dados do sindicato nacional das distribuidoras (Sindicom); os outros 20% estão pulverizados entre 198 pequenas empresas, espalhadas pelo país.


Talvez venham a ser justamente estas os fiéis da balança, conforme arrisca o presidente do sindicato paulista da revenda (Sincopetro), José Alberto Paiva Gouveia, que encontra eco nas palavras de dirigentes da entidade representativa das distribuidoras regionais (Brasilcom). (Veja mais na página 20)


Incorporações, fusões e aquisições têm sido verificadas em muitos setores nos últimos anos, não apenas no de distribuição de combustíveis. “É uma tendência que visa o fortalecimento das empresas”, diz Gouveia, que, porém, não considera a concentração algo saudável. Ele pondera que tanto pode ocorrer aumento, quanto redução nos preços dos combustíveis, mas adverte: “se a concorrência diminuir e houver aumento nos preços, como aconteceu na Argentina, revendedores e consumidores serão prejudicados.” “Acredito que a ‘troca de bandeira’ deixará de existir, entretanto, por mais que haja incorporações, há um considerável número de distribuidoras regionais, de postos independentes, que podem equilibrar esse mercado”, constata.


De acordo com informações da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (Seae-MF), em operações envolvendo o setor de distribuição de combustíveis, o foco da análise do órgão considera dois mercados: distribuição e revenda de combustíveis, sendo que esta última em função da competitividade intermarcas no varejo. A Seae busca avaliar o impacto na concorrência e junto ao consumidor final, em cada caso concreto. Diante de potencial efeito negativo à concorrência, o órgão sugere ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a não aprovação da operação ou a aprovação com restrições. Hoje, nesse setor, apenas os processos da ALE-Repsol e da Shell-Cosan continuam sob análise. Os critérios utilizados para submissão de uma operação são faturamento igual ou superior a R$ 400 milhões, de pelo menos um dos grupos econômicos envolvidos, ou participação de mercado igual ou superior a 20%.


Para a Seae, a princípio, parece um movimento normal no mercado, que vivenciou um período de mudanças, com a entrada de empresas, relacionado com a gradual liberalização do setor. Já o presidente do Sincopetro acredita que, para as companhias internacionais, o mercado brasileiro continua sendo atrativo, por ter grande potencial para expansão do consumo, mas reflete que o investimento deverá ser alto, na compra de bandeiras já instaladas, visto que, no momento, o mercado está saturado. Do seu ponto de vista, a fusão com a Cosan foi a forma de a Shell garantir condições de permanecer no mercado, em pé de igualdade com as outras duas gigantes. (CCS)


 



Linha do tempo


Fusões e aquisições não são novidades nesse setor. Em 1959, para espanto geral, a Ipiranga comprou a Gulf International no Brasil e, a partir de sua criação, em 1971, a jovem BR Distribuidora se desenvolveu absorvendo empresas menores, como a Nacional.


Mas é a partir da década de 90, com os ventos da abertura, que esse mercado começa a sofrer grandes transformações. Até então operavam no Brasil Atlantic, BR, Esso, Ipiranga, Shell, Texaco e as regionais Cia. São Paulo e Hudson. Ao longo da década o mercado assistiu à chegada de outras multinacionais e ao surgimento de centenas de pequenas distribuidoras, de atuação regional, parte das quais fechada posteriormente, por conta de legislações mais precisas e severas e de maior rigor na fiscalização tributária e da qualidade dos combustíveis.


  


























1993


A Ipiranga volta a surpreender o mercado, com a compra dos ativos da Atlantic no Brasil.


1998


A Agip adquire a Cia. São Paulo, estreando na distribuição de combustíveis, com 1,1 mil postos. No ano seguinte, compra a Ipê Distribuidora, acrescentando 118 postos à rede. Depois, amplia sua participação neste mercado com a compra de 258 postos da Shell.


2004


A Agip do Brasil vende a totalidade de seu capital para Petrobras e BR Distribuidora. O pacote inclui 1,6 mil postos, algo como 4% do mercado, e possibilita a ampliação da participação da empresa na distribuição de GLP.


2006


Ocorre a fusão de duas regionais, a mineira ALE, com atuação predominante no Sudeste e no Centro Oeste, e a potiguar SAT, presente especialmente no Nordeste e em estados do Norte, que passam a usar a marca ALE.


2007


A Petrobras, o Grupo Ultra e a Braskem compram os negócios do Grupo Ipiranga. A participação da Ipiranga nesse mercado era de quase 20%.


2008


Em abril, depois de acirrada disputa com Petrobras e Grupo Ultra, a Cosan, maior produtora de açúcar e etanol do Brasil, compra as operações de distribuição e revenda da Esso no Brasil, que abrangia rede de 1,5 mil postos em 20 estados.


Nesse mesmo mês, a ALE adquire a rede Polipetro, com 130 postos no Sul, e, em dezembro, assume a distribuição da Repsol, com 327 postos, passando a deter mais de 1,3 mil postos e a representar 4,6% do mercado.


Em agosto desse ano, o Grupo Ultra, que detém a marca Ipiranga no Sul e no Sudeste, adquire os ativos da Texaco do Brasil, elevando sua participação de mercado de 14% para 23% e estendendo sua presença ao Norte, Nordeste e Centro-Oeste.


2010


No dia 1º de fevereiro o mercado é surpreendido com a notícia da criação de uma joint venture entre a Shell e a Cosan-Esso. Além de atuar nas áreas de produção de açúcar, etanol e energia e de distribuição e revenda de combustíveis, a nova empresa cria condições excepcionais para a abertura e a consolidação de mercados externos para o etanol brasileiro. É a terceira no ranking nacional de distribuição hoje.


(CCS)