por Cristiane Collich Sampaio


e Márcia Alves


 


Tudo indica que o assunto da sonegação de tributos no mercado de etanol e do desequilíbrio que isso provoca no setor de combustíveis permanecerá em pauta por mais tempo. Infelizmente.


Os órgãos de regulação e fiscalização, assim como os segmentos envolvidos conhecem muito bem como se processam as fraudes fiscais nesse mercado. Em edição recente, a PO divulgou os esquemas mais comuns, como o chamado “barriga de aluguel” e os descaminhos, nos quais o produto destinado a produção de bebidas ou ao uso industrial, com alíquota menor de ICMS, é comercializado como combustível, entre tantos.


O fato é que, segundo estimativas do sindicato nacional das distribuidoras (Sindicom), em virtude disso, em 2009 a evasão de tributos no etanol atingiu a nada modesta cifra de R$ 1 bilhão, o que engloba o ICMS, de competência dos estados, e o PIS e a Cofins, que cabem aos cofres federais. E quem está pagando o ônus são empresas idôneas, de distribuição e revenda, que perdem vendas para sonegadores.


Para alguns, como o secretário executivo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Manoel Vicente Fernandes Bertone, a solução passa, necessariamente, pela reforma tributária. Em outras esferas, discutem-se medidas pontuais, embora, até o momento, não exista um foro amplo, com os representantes das diferentes áreas e níveis de governo e os agentes privados, que articule propostas e soluções.


No início de agosto, o diretor da ANP, Allan Kardec Duailibe Filho, chegou a propôr a realização de reuniões com as receitas estaduais e o setor privado para debater o assunto, ainda que a agência não seja responsável sobre a fiscalização da produção de etanol. Ele foi procurado para comentar a questão e o andamento desse foro, mas não se manifestou até o fechamento desta edição, o mesmo ocorrendo com o diretor de Combustíveis Recicláveis do Ministério de Minas e Energia (MME), Ricardo Dornelles.


De toda forma, se for criado, esse organismo terá de ser mais amplo, com a presença do Mapa, do MME e da Secretaria da Receita Federal (SRF), responsável pelo recolhimento dos tributos federais.


 


Solução abrangente


 


Para o secretário executivo do Mapa, o problema da sonegação no Brasil advém principalmente de um sistema tributário pouco racional e excessivamente oneroso para a sociedade: “como a carga tributária é elevada, aumenta-se a possibilidade de sonegação, o que distorce a concorrência entre participantes dos respectivos mercados, inclusive entre as usinas. A reforma tributária é uma necessidade premente, reconhecida por todos, Governo e iniciativa privada.”


Manoel Bertone comenta, ainda, que o etanol é derivado de um produto agrícola, cujos custos de produção apresentam características muito diferentes de outros ramos industriais. “Em determinados momentos, a inadimplência tributária acaba sendo quase que inevitável, o que não deve ser confundido com “sonegação planejada” ou fraude tributária”, esclarece, acrescentando que o problema existe, é sério, mas não se restringe às unidades produtores, sendo uma prática também presente nos demais elos da cadeia.


“A sociedade brasileira encontra-se em grande evolução e deveríamos nos balizar pelos sistemas tributários de países mais desenvolvidos”, opina, explicando que “o modelo de maior sucesso é a tributação clara e explicita do consumo, como se faz nos países desenvolvidos”. Para o secretário, “mudar o responsável por recolher o imposto, concentrando nos produtores os tributos de toda a cadeia, não resolverá o problema e pode causar outros, também de grande gravidade”.


 


No curto prazo


 


Na entrevista, Bertone informou que o Mapa não possui instrumentos de controle tributário, mas que pode contribuir para o debate, assim como com órgãos de fiscalização, com o fornecimento de informações. O ministério e a ANP, mediante convênio, já partilham dados sobre a produção de etanol. Mas, segundo ele, “sonegação é uma questão que deve ser tratada pela SRF e pelas secretarias de receita estaduais”.


E, ao menos no que se refere a estas últimas, parece que o processo para inviabilizar as fraudes fiscais está em andamento.  Ao lado de medidas adotadas anteriormente, na edição passada, o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Marcos Jank, já informava que a assinatura do convênio Confaz nº 101, em julho passado, havia formalizado a troca de informações entre as secretarias de fazenda e o Mapa, permitindo a todas as secretarias acompanhamento mais estreito sobre as transações comerciais com o etanol, com grandes efeitos sobre a sonegação no longo prazo. Além disso, ele propõe a unificação das alíquotas de ICMS em todos os estados como um elemento importante para evitar distorções de mercado e acabar com a evasão desse imposto.


Mas essas são apenas parte das sugestões apresentadas e das medidas já adotadas para coibir as práticas fiscais ilícitas e reequilibrar o mercado de combustíveis. (Veja mais nesta seção)


O presidente do sindicato paulista da revenda (Sincopetro), José Alberto Paiva Gouveia, adverte, porém, que é fundamental o envolvimento dos órgãos federais das áreas tributária e de combustíveis na resolução do problema. “Podemos, nos estados, dar fim à sonegação do ICMS, mas PIS e Cofins são tributos federais”, declara. (CCS)