por Cristiane Collich Sampaio


 




“Todos os envolvidos a Operação Octopus estão novamente a solta, praticando preços de venda mais baixos do que aqueles que nós, revendedores, que recolhemos todos os tributos, conseguimos na aquisição de combustíveis de nossas distribuidoras. Como podem estas pessoas, já denunciadas pelo Ministério Público, voltar a praticar os mesmos atos do passado? Por que tudo continua como antes?” Este trecho do desabafo de um revendedor mineiro expressa a desilusão da grande maioria dos empresários do segmento de combustíveis com os órgão públicos e a legislação vigente.


A Operação Octopus, que envolveu as secretarias da Fazenda de Minas Gerais (SEF-MG) e de São Paulo (Sefaz-SP) e o Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG), teve início em novembro de 2007, após a constatação da ocorrência de sonegação fiscal no etanol. Em junho passado a investigação chegou aos responsáveis. Postos, usinas e distribuidoras – estas com sede no estado de São Paulo – foram autuados, ocorreram diversas prisões e houve intervenção estadual em parte dos estabelecimentos.


O promotor Renato Froes, do Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG), revela que nos postos, a aquisição de álcool combustível sem nota fiscal ou com documento ‘frio’, às vezes ‘reaproveitado’, e adulteração de encerrantes foram as principais irregularidades encontradas, enquanto que, nas distribuidoras, o fornecimento direto do combustível das usinas para os postos, sem controle de qualidade. “Além disso, eram mantidos pelos revendedores vínculos com ‘corretores autônomos’ que intermedeiam a venda do etanol mediante utilização de notas de distribuidoras chamadas ‘barrigas de aluguel’, que servem apenas para fornecer o documento fiscal, várias vezes ‘reutilizados’ pelos responsáveis pelo transporte do álcool”, acrescenta.


 


A lei e a Justiça


 


Ele conta que “no decorrer das investigações foram expedidos mandados de prisão temporária contra mais de vinte pessoas” e que, com o encerramento das apurações, “foram denunciadas mais de 30 pessoas pela prática de vários crimes, dentre eles: lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, falsidade documental e crime contra a ordem econômica. Administrativamente, a Receita Estadual está elaborando autos de infração contra os postos, débito que, ao todo, deve ultrapassar R$ 10 milhões.”


Em resposta à denuncia do revendedor de Minas Gerais, Froes esclarece que “uma das medidas adotadas pelo MP-MG foi o sequestro de bens dos envolvidos, especificamente para garantir o ressarcimento aos cofres públicos em caso de condenação dos acusados”. Também foi determinada a intervenção nos postos, tendo a Justiça nomeado um administrador judicial para ‘gerenciar’ temporariamente os estabelecimentos. “Decorridos cerca de 100 dias, os comércios retornaram às mãos dos respectivos proprietários, mas não sem antes promover-se a substituição de todos os programas eletrônicos instalados nas bombas abastecedoras de álcool”, revela. Ele ressalta que “o funcionamento (regular, é óbvio) do comércio é um ‘direito’ dos proprietários, pelo menos enquanto não decidida a ação criminal”.


A SEF-MG, segundo o procurador, pretende cancelar a inscrição estadual das distribuidoras envolvidas e tentar proibir a atuação delas no estado. Porém ele lembra que iniciativas desse tipo acabam sendo derrubadas na Justiça, sendo comum o restabelecimento da inscrição estadual mediante mandado de segurança.


A secretaria informou que, como resultado da Operação Octopus, além do acréscimo direto na receita tributária do setor, de cerca de R$ 25 milhões, em agosto de 2009, creditado ao aumento de vendas legais de álcool hidratado por parte das distribuidoras do estado, foi suspensa a inscrição estadual de três distribuidoras, dois postos revendedores tiveram sua inscrição cancelada e dezenas de placas de CPU de bombas foram trocadas, por ordem judicial.


 


Passando o ‘mico’


 


Conforme declarações de Renato Froes, a intervenção nos postos comprovou as irregularidades, mas não foi prorrogada em razão dos riscos que envolviam o negócio. “Afinal, muitos só eram lucrativos em razão daquela praxe criminosa e alongar a administração poderia resultar na ‘falência’ dos postos nas mãos do estado”, constata, afirmando, ainda, que, “se comprovadas novas fraudes, nada impedirá nova intervenção e novos pedidos de prisão preventiva”. Ele lembrou, ainda, que a cassação da autorização para funcionamento desses estabelecimentos poderá ser determinada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).


As investigações do MP-MG já foram encerradas, mas o processo criminal envolvendo mais de 30 pessoas – que corre na 4ª Vara Criminal de Belo Horizonte – não tem prazo para ser concluído. Em outras palavras, isso quer dizer que os estabelecimentos continuarão em funcionamento até o final dos processos, o que pode demandar anos.


Ao analisar o setor de combustíveis, o procurador Renato Froes julga necessárias mudanças legislativas, que, a seu ver, devem tentar “conciliar os interesses arrecadatórios do Estado com os interesses comerciais dos agentes envolvidos” e, também, “maior e melhor regulamentação do setor, principalmente no que se refere ao processo de distribuição dos combustíveis”.