Cristiane Collich Sampaio


 


Na função há cerca de dois anos, Jefferson Paranhos Santos, superintendente de Fiscalização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), comenta o que vem sendo feito pela agência nesse período para sanear o mercado de combustíveis e o que ainda precisa ser feito.


Para ele, é fundamental a edição rápida de novas resoluções e também do Código Brasileiro de Combustíveis (CBC), assim como a redução do tempo de trâmite dos processos administrativos, para tornar o trabalho do órgão mais eficaz. Mas não descarta a importância de dotação de verba adequada, de funcionários capacitados e de sistemas informatizados para elevar a eficiência da fiscalização.


 


Posto de Observação – Como são articuladas as ações de fiscalização da agência e definidas as prioridades?


Jefferson Paranhos Santos – Hoje temos um planejamento anual – algo com que não contávamos há dois anos –, baseado no exercício do ano anterior, levando em conta a presença de irregularidades regionais apuradas no programa de levantamento de preços e de monitoramento da qualidade dos combustíveis. Os resultados desses programas compõem um banco de dados que nos alimenta com informações sobre o mercado. Além disso, temos operações de urgência, determinadas por problemas eventuais, apurados em algumas regiões, e por denúncias do mercado. E, ainda, as que atendem a demandas de órgãos públicos, como secretarias da Fazenda dos estados, ministérios públicos, Judiciário.


Este ano, já fechamos o planejamento da fiscalização para 2007.


 


P.O. – No aspecto preço, uma vez que o mercado é livre, o que a ANP considera irregular?


Paranhos – O acompanhamento dos preços serve como um indicativo de irregularidades para a Superintendência de Fiscalização. Essas informações são cruzadas com as do nosso banco de dados; um preço muito baixo pode estar relacionado com problemas de qualidade ou com o não pagamento de tributos, o que envolve as secretarias da Fazenda.  Se o caso fugir da competência da agência, encaminhamos o assunto aos órgãos de defesa da concorrência, como Cade, SDE-MJ e Seae-MF.


 


P.O. – Por meio de convênios com órgãos estaduais de todo o país a ANP tornou sua fiscalização mais eficiente. Poderia comentar os resultados já obtidos?


Paranhos – A formalização desses convênios foi uma das coisas mais eficazes que executamos, pois a troca de informações teve resultados sensacionais, que me deixam muito satisfeito. Na Paraíba, por exemplo, a arrecadação do ICMS sobre os combustíveis – que em geral responde por grande parcela da arrecadação total de muitos estados – subiu mais de 25% após o convênio de fiscalização da agência com a Secretaria da Fazenda. E no estado de São Paulo, onde a parceria é mais recente e ainda está se consolidando, a arrecadação de ICMS já aumentou cerca de 28%.


Este ano a ANP passou a contar com novos servidores. Eles estão atuando como gestores, supervisionando a consolidação e aplicação desses convênios. Além disso, estamos investigando a movimentação de combustíveis e solventes, com base nas novas resoluções.


 


P.O. – Qual o destino dos combustíveis fora da conformidade e como a ANP controla o reprocessamento desses produtos?


Paranhos – Atualmente a decisão sobre os processos de adulteração demora até 120 dias, e, além disso, não temos como acompanhar o destino do produto adulterado apreendido e saber se, de fato, ele foi encaminhado para ser reprocessado numa refinaria, por exemplo. Sabemos que esse combustível pode ter sido transferido para um outro posto do mesmo proprietário e, por esse motivo, procuramos fiscalizar esses demais postos, bem como, por amostragem, os estabelecimentos reincidentes.


Por outro lado, o rompimento dos lacres de bombas e tanques tem de ser autorizado pela ANP, sob pena de sanções aos infratores; muitas vezes fazemos o acompanhamento, mas em outras a autorização é encaminhada por ofício, sem a presença de fiscais, pois os que temos são insuficientes.


Lamentavelmente temos indícios de que boa parte desses produtos volta ao mercado.


Sou favorável ao perdimento dos produtos adulterados e à cassação do registro do agente que burla a legislação. Temos de ser radicais.


Hoje, a legislação que fala do perdimento é frágil e, por isso, defendo que se altere a Lei do Petróleo e que se inclua isso no Código Brasileiro de Combustíveis (CBC), que está na Câmara dos Deputados.


 


P.O. – Diante de denúncias, como a ANP age em caso de venda de combustíveis por empresa não cadastrada no órgão?


Paranhos – Toda a empresa que trabalha com combustíveis tem de ter registro na ANP e a que atua sem registro é lacrada. Porém, há fabriquetas de biodiesel e lubrificantes, que não se identificam como agentes do setor de combustíveis, mas despejam produtos no mercado. Nesses casos, a apuração de irregularidades se dá pela verificação das notas fiscais de compra.


É importante lembrar que os revendedores só podem comprar combustíveis de distribuidoras registradas na ANP e, em caso de desrespeito à legislação, deverão arcar com as sanções cabíveis, entre as quais a lacração do estabelecimento.


“Usinas e destilarias podem ser autuadas se venderem álcool para outros agentes que não distribuidoras registradas na ANP.”


 


P.O. – Hoje a ação da ANP passou a se estender aos produtores de álcool. Como é feita essa fiscalização?


Paranhos – Em setembro, firmamos um convênio com o Ministério da Agricultura que nos permite fiscalizar a comercialização de álcool combustível, embora o controle sobre a produção continue cabendo ao ministério. Por meio desse convênio, temos condições de rea­lizar o cruzamento entre os volumes de compra informados pelas distribuidoras e os produzidos nas usinas. De acordo com a legislação, usinas e destilarias podem ser autuadas se venderem álcool para outros agentes que não distribuidoras registradas na ANP e postos que não comprarem exclusivamente de distribuidoras registradas podem ser autuados e interditados.


“A nova resolução determina que todos os PAs (...) não podem vender combustíveis.”


 


P.O.  – Como fica a fiscalização dos pontos de abastecimento (PAs) e das Centrais Avançadas de Inspeção e Serviços da BR (Cais) diante da suspensão da Portaria
nº 14/96 do DNC?


Paranhos – A nova resolução está em vias de ser publicada. Em síntese, ela determina que todos os PAs têm de ser cadastrados na ANP e não podem vender combustíveis.


Temos recebido muitas denúncias e atualmente a fiscalização atua in loco, verificando se os PAs estão revendendo combustíveis. Quando constatamos a realização de vendas, eles são interditados. Temos algumas vitórias nesse campo, todavia, fico constrangido em admitir que, pela falta de base legal, na maioria das vezes os PAs conseguem reabrir as portas, protegidos por decisão judicial.


Com relação as Cais, que considero como um tipo de PA só que com uma amplitude maior, elas têm prejudicado demais os postos, especialmente os de estrada, pois lidam com grandes volumes. Essa é uma outra lacuna que deverá ser preenchida pela nova resolução sobre PA. Isso é urgente porque, uma vez que o PA e a Cais não estão regulamentados, a ação dos órgãos ambientais sobre eles fica igualmente prejudicada.


 


P.O. – As distribuidoras podem vender produtos  a agentes, no caso os pontos de abastecimento, que não possuem registro na ANP?


Paranhos – Infelizmente, hoje elas ainda podem vender para empresas que não têm cadastro na agência. Mas a nova resolução sobre distribuição – que deve ser publicada em breve – proíbe a comer­cialização entre empresas congêneres e determina que as distribuidoras só poderão vender combustíveis para agentes cadastrados na ANP (PAs, postos e TRRs). Em caso de desrespeito, as sanções serão pesadas. Com isso preencheremos mais uma grande brecha legal.


 


P.O.  –  Já teve início a fiscalização dos postos-escola?


Paranhos – A fiscalização está encarando o posto-escola como um posto revendedor comum, enquanto a Superintendência de Abastecimento trata do assunto com as distribuidoras. Mas, posteriormente, faremos ações específicas para verificar se os agentes estão enquadrados na Resolução nº 4/06.


 


P.O.  – Quais as perspectivas no curto e médio prazo?


Paranhos – Dobramos o número de servidores na superintendência e vamos investir em capacitação, mas ainda somos cerca de 100 apenas e, portanto, as parcerias com os órgãos estaduais  do setor continuam sendo muito importantes.


Considero fundamental a edição rápida das novas resoluções e também a redução do tempo de trâmite dos processos administrativos. É importante ainda o aumento do número de funcionários, especialmente no setor de informática, para que, por meio dos programas adequados, possamos aprimorar a detecção de fraudes sem aumentar os deslocamentos de fiscais e os custos.


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