por Cristiane Collich Sampaio


  


Haroldo Lima entrou na Agência Nacional do Petróleo (ANP) em 2003, como diretor. Em 2005, depois de ocupar o cargo de diretor geral interinamente, foi efetivado, substituindo Sebastião do Rego Barros na função.


Nesses pouco mais de dois anos, a ANP se dedicou a reorganizar o mercado de combustíveis, como em nenhum outro período até então. Em seu primeiro mandato, Lima investiu na revisão dos marcos regulatórios do setor e na intensificação da fiscalização, também por meio de convênios com outros órgãos do poder público, procurando reverter a situação de calamidade instalada nos segmentos ligados à comercialização dos produtos. Nessa tarefa, contou com grande apoio de entidades do setor, como o Sincopetro.


Em dezembro de 2007, foi reconduzido ao cargo para nova gestão, que expira no final de 2011. Nessa entrevista exclusiva, ele fala sobre o mercado atual, biodiesel, GNV e sobre as novas iniciativas que pretende implementar durante este mandato.


 


Posto de Observação – Qual sua avaliação sobre esses primeiros meses da implantação do B2 no país?
Haroldo Lima – De forma geral, a implantação do biodiesel na matriz energética do país está superando todas as expectativas. Temos que considerar a dimensão do nosso país e, naturalmente, alguns problemas surgirão, principalmente aqueles relacionados à logística de entrega do produto em regiões remotas, como na Norte. A ANP, juntamente com os agentes do mercado, vem fazendo os ajustes necessários para minimizar os problemas, que já diminuíram consideravelmente após a segunda quinzena de janeiro. Acredito que a criação pela agência da Sala de Monitoramento do Biodiesel, coordenada pela Superintendência de Abastecimento (SAB) e integrada por representantes de toda a cadeia de comercialização, está contribuindo significativamente para identificar e solucionar os problemas.
Infelizmente, a agência ainda não possui ferramenta capaz de aferir a qualidade da mistura no posto, como pode ser feito com a do álcool anidro na gasolina. Esse tipo de análise só pode ser realizado nos laboratórios credenciados. No entanto, todo o biodiesel comercializado por produtores e distribuidores deve ser acompanhado de um certificado, que garante a qualidade do produto e identifica seu responsável.

PO – Como estão os estudos para a elevação da presença de biodiesel na mistura em percentuais superiores a 5%?
H. Lima – A responsabilidade sobre a antecipação da mistura no teor de 5%, prevista para 2013, é do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), seguindo diretrizes do Governo Federal. É provável que no médio prazo, dependendo do volume de produção de biodiesel, seja liberada a comercialização de mistura com teor intermediário, possivelmente 3%, mas essa medida ainda se encontra em avaliação, principalmente sob a ótica dos fabricantes de veículos automotores. Em relação à comercialização com teores superiores a 5%, esta está vinculada a autorização específica da ANP para grandes consumidores, para uso em caráter experimental.


PO – Quais seus projetos para este novo mandato? A revisão de resoluções, encontra-se entre eles?
H. Lima – Na gestão anterior, no campo da regulação do downstream, tivemos diversos atos de grande relevância para o abastecimento nacional, como a inserção do biodiesel na matriz. Além disso, foi determinado o cadastramento obrigatório das usinas de álcool na ANP, bem como o envio mensal de dados de comercialização de álcool combustível para fins automotivos. Também foram publicadas novas resoluções para as atividades de distribuição de solventes, combustíveis de aviação e as relacionadas com TRR e posto escola. Adicionalmente, foram publicadas resoluções definindo o ponto de abastecimento (PA) e a figura do grande consumidor. Com isso, praticamente todos os segmentos envolvidos no abastecimento nacional de combustíveis tiveram sua regulamentação atualizada.
Na área de fiscalização, a partir de mudanças internas relacionadas ao foco no fato gerador das ações, passamos a atuar de forma motivada, inteligente e eficiente, aumentando consideravelmente nosso índice de sucesso. Essa medida, aliada a intensificação dos convênios de fiscalização celebrados com órgãos públicos, contribuiu para reduzir a sensação de impunidade de empresas inidôneas e sanear o mercado.
A partir de agora, no downstream os principais projetos são consolidar a participação dos biocombustíveis na matriz energética, reforçar o poder de fiscalização da agência e manter a tendência de queda do índice de não conformidade dos produtos.


 


(olho)“As propostas de alteração na regulamentação (da revenda) estarão disponíveis para comentários e contribuições da sociedade tão logo seja definido o período de consulta pública.”



PO – Qual seria o objetivo de eventuais mudanças na regulação da atividade de revenda de combustíveis?
H. Lima – Essas mudanças têm sempre como objetivo a proteção do consumidor e o justo ambiente concorrencial. Com a revenda não será diferente e, respeitando a conduta de transparência nas decisões institucionais da ANP, as propostas de alteração na regulamentação estarão disponíveis para comentários e contribuições da sociedade tão logo seja definido o período de consulta pública.

PO – A seu ver, as recentes mudanças na tributação do álcool irão restringir as possibilidades de evasão fiscal e auxiliar no reequilíbrio do mercado de combustíveis?
H. Lima – A tributação monofásica minimiza as chances de evasão fiscal, contribuindo, assim, para o equilíbrio no ambiente concorrencial. É o que se observa com os combustíveis derivados de petróleo. Algumas medidas já foram adotadas com o mesmo objetivo, como a publicação da Resolução ANP nº 7, em março de 2007, deixando explícita a proibição de fornecimento de produtos por distribuidores para postos que exibam a marca comercial de outro distribuidor, e a redução da alíquota do ICMS do álcool pela Secretaria de Fazenda Estadual de São Paulo (Sefaz-SP), que além de inibir a concorrência desleal acabou gerando mais receita para o estado.

PO – Medidas relacionadas ao nivelamento das condições de comercialização oferecidas aos diferentes agentes estão sendo analisadas?
H. Lima – Consideremos que, de um modo geral, nos segmentos da atividade econômica operam grandes, médias e pequenas empresas. O que a agência busca é propiciar, por meio de revisões na regulamentação e ações de fiscalização, as condições de competição entre esses agentes. Nesse sentido, continuaremos a luta para revogar as autorizações e retirar do mercado aquelas empresas que comprovadamente atuam de forma ilícita, perturbando o ambiente concorrencial.


(olho) “O quantitativo de PAs está sendo atualizado diariamente. Até 29 de fevereiro eram 158 PAs autorizados pelo sistema disponível online



PO – A ANP já tem o registro de todos os PAs, Cais e Postos Escola em funcionamento no país? Quantos existem atualmente? Quais os reflexos sobre o segmento da revenda tradicional?
H. Lima – A regulamentação da ANP para os PAs (definida na Resolução nº 12/07) entrou em vigor em 1º de janeiro deste ano, portanto é bem recente, e o quantitativo de PAs está sendo atualizado diariamente. Até 29 de fevereiro eram 158 PAs autorizados pelo sistema disponível online. As instalações do Projeto Cais estão inseridas nessa regulamentação. Já quanto à regulamentação dos postos escola (prevista na Resolução nº 04/06), podemos afirmar com segurança que essas instalações estão sendo utilizadas de acordo com seu objeto, que é o treinamento de mão-de-obra especializada. São 14 estabelecimentos no país, todos de propriedade da BR, e o receio que as distribuidoras fossem utilizar esses postos para fins puramente comerciais hoje não existe mais.

PO – Diante de um possível apagão no setor elétrico, é válido afirmar que o segmento de revenda de GNV poderá ter seu crescimento desestimulado?
H. Lima – É prematuro afirmar qualquer coisa nesse sentido. O risco de apagão no setor elétrico hoje está menor, mas o Governo já sinalizou que a prioridade para o gás natural é geração de energia e abastecimento do setor industrial. Acredito que, por um bom tempo, o fator chave dessa equação residirá no regular fornecimento de gás natural pela Bolívia e também na capacidade de a Petrobras otimizar o aproveitamento do gás produzido internamente e no aumento físico de sua produção.