por Cristiane Collich Sampaio





 


Com a atuação conjunta da Agência Nacional do Petróleo (ANP), prefeitura da capital e Instituto de Pesos e Medidas (Ipem), com a participação da Secretaria da Fazenda do estado e do Sincopetro, ocorreu sensível queda nos índices de não conformidade dos combustíveis em terras paulistas nos últimos anos.


A título de exemplo, o superintendente de Fiscalização da agência, Jefferson Paranhos, ouvido nesta entrevista, cita a gasolina: na capital, onde a ação foi mais drástica, o índice despencou de 6,6% para 3,6% entre 2006 e 2007. (Veja mais no box)


Ele assinala que novas legislações locais – parte das quais também implementada em outros estados – e convênios deram suporte mais consistente à fiscalização. Porém lamenta a demora na aprovação de lei federal que permita à ANP atuação mais rápida e efetiva.


À reportagem da Posto de Observação, Paranhos apresentou detalhada análise do mercado atual, apontando as falhas do sistema e as perspectivas de aprimoramento, sem poupar críticas e elogios aos envolvidos.


 


Posto de Observação – Poderia fazer um balanço nacional dos últimos anos quanto ao número de ações da ANP no campo da comercialização de combustíveis?


Jefferson Paranhos – Em 2006 e 2007, registramos número semelhante de ações de fiscalização, algo em torno de 24 mil. Destas, 70% – cerca de 16 mil – tiveram como foco distribuidoras e postos de combustíveis. De um ano para outro ocorreu redução substancial, de 20%, no número de autuações, o que mostra que o mercado evoluiu, que está mais correto.


 


PO – E no estado de São Paulo?


Paranhos – Nesse período demos especial atenção aos mercados de São Paulo e Rio de Janeiro, por suas dimensões e pelo grande número de irregularidades detectadas. Em São Paulo, especialmente na capital, não há como negar a importância da força-tarefa, composta por agentes da ANP, do Ipem-SP e do Departamento de Controle do Uso do Solo (Contru) da prefeitura, no combate à adulteração. Fiscais municipais foram treinados pela ANP, após assinatura de convênio entre a agência e o prefeito Gilberto Kassab, em maio de 2006. E ele próprio se empenhou na iniciativa, determinando a interdição física dos postos que comercializavam produtos irregulares, com a colocação de obstáculos em cimento.


O resultado da parceria tem sido ótimo na capital. Agora os agentes irregulares estão vendo que, uma vez lacrado, reabrir o posto deixou de ser tarefa fácil.


Já a Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz), que foi empurrada pela força-tarefa, ainda mantém uma atitude peculiar; se seu envolvimento tivesse sido mais efetivo, os números da adulteração no estado estariam próximos aos da capital. Mas geralmente essa é uma atitude comum a Sefaz, também em outros estados.


 


“As novas legislações do estado e do município tiveram papel fundamental no controle da adulteração em São Paulo.”


 


PO – Qual o papel da nova legislação nesse contexto?


Paranhos – As novas legislações do estado e do município tiveram papel fundamental no controle da adulteração em São Paulo. Por exemplo, a lei estadual de perdimento é muito eficaz. Ao determinar perda financeira imediata e substancial, ela inibe os fraudadores.


O exemplo do estado foi seguido em Minas Gerais, Pernambuco, Ceará e Paraíba e leis semelhantes também estão em vias de aprovação em Goiás e no Espírito Santo. No Rio de Janeiro há leis e, em comparação com o governo anterior, houve sensível evolução na parceria.


Quanto aos estados do Sul, continuam sendo uma decepção: ainda não conseguimos fechar convênios e os governos também não se movimentaram para ter leis próprias.


Apesar da importância dessas legislações, a federal precisa ser atualizada com urgência, pois não fornece à agência os instrumentos necessários para a atuação mais conseqüente e rápida de que o mercado precisa. Hoje, a ANP é obrigada a liberar o posto, quando o proprietário diz ter mandado o combustível irregular para ser reprocessado na distribuidora. Mas a agência só tem condições de acompanhar cerca de 1% dessas transferências.


Há anos um projeto nesse sentido circula no Congresso Nacional, sem, no entanto, chegar à fase de votação.


 


PO – Quais os resultados obtidos com as investidas sobre o mercado paulista?


Paranhos – Além da redução da adulteração, pelos testemunhos de sindicatos e agentes, vem se observando ligeira elevação nas vendas de combustíveis, especialmente na capital, ainda que isso seja em parte reflexo do incremento da economia brasileira.


Nos estados que têm convênio com a ANP, houve elevação da arrecadação do ICMS nos combustíveis por conta da redução dos índices de adulteração e sonegação. Assim, não entendo a recusa de secretarias da Fazenda em fazer parceria com a agência.


 


PO – A ANP pretende investir em parcerias com outras prefeituras?


Paranhos – As portas da ANP não estão fechadas, mas hoje não estamos preparados para atender os mais de 5 mil municípios brasileiros. São Paulo é uma cidade-estado e a parceria contou com o empenho pessoal do prefeito Kassab. Esse é um projeto-piloto, assim como o de Salvador (BA), na área do GLP, que foi acertado com a Sefaz do estado. Vamos ver o que vai ocorrer nos próximos anos.


 


PO – Quais as metas da fiscalização para 2008?


Paranhos – Passamos a atuar com parceiros efetivos, por meio dos convênios. Atualmente temos 13 em vigor e outros quatro ou cinco em vias de serem firmados com estados. Nossa meta é reduzir o índice nacional de não conformidade para menos de 3% na gasolina, percentual aceitável internacionalmente. E estamos a caminho de superar essa barreira. Também buscamos a maior regularidade na revenda e distribuição de combustíveis automotivos e também em outros segmentos.


Para isso, além do constante monitoramento, também continuamos utilizando as informações do próprio mercado para disparar operações emergenciais. Esperamos que os agentes continuem interagindo conosco.


Quanto ao equilíbrio concorrência, a agência tem estudos e procura minimizar eventuais perdas dos agentes de menor porte. Porém há a questão da vantagem tributária para grandes empresas e os direitos constitucionais que preservam a livre iniciativa. Esse não é um tema fácil de ser equacionado.


 


PO – Qual sua avaliação sobre os primeiros meses de comercialização do B2?


Paranhos – Registramos apenas falhas pontuais, que já foram corrigidas. Num primeiro momento, realizamos controle interno e visita aos produtores, verificando o recebimento de volumes proporcionais de diesel e biodiesel e a qualidade do B100, com autuação de pseudoprodutores, que não produzem biodiesel dentro das especificações oficiais. Distribuidoras também estão na mira, pois se especula que algumas venderam o diesel sem a mistura.


Detectamos que embora a qualidade esteja sob controle, não há tecnologia disponível para determinar o percentual da mistura nos postos, como ocorre com a mistura gasolina-álcool. O teste só pode ser feito em laboratório ou por meio da verificação da aquisição de quotas de diesel e de biodiesel compatíveis com a mistura B2. Também observamos alguns “furos” nos marcadores do biodiesel e esse problema está sendo estudado.


 


Os números são a prova


Leis mais rígidas, trabalho conjunto de órgão de diversas esferas, fiscalização intensa e colaboração de entidades ligadas ao setor, como o Sincopetro, foram capazes de reverter, em menos de 12 meses, o quadro de calamidade que há anos se mantinha praticamente inalterado no mercado paulista e paulistano de combustíveis.


Os números a seguir provam que com esses ingredientes é possível reduzir drasticamente a fraude. Que o exemplo sirva de lição.


 


Índices de não conformidade


















































Ano/


Produto


2006


2007


 


 


Brasil


São Paulo


(estado)


São Paulo


(capital)


Brasil


São Paulo


(estado)


São Paulo


(capital)


Gasolina


3,9


7,4


6,6


2,8


4,6


3,6


Álcool


2,6


3,3


2,1


1,9


1,7


1,1


Diesel*


3,8


2,4


3,2


3,1


2,1


0,9


Fonte: ANP


 


* Uso de diesel interior em área urbana e/ou metropolitana.