por Denise de Almeida

Ricardo Shamá - Presidente da Câmara Ambiental do Comércio de Combustíveis Derivados de Petróleo e Biocombustíveis da Cetesb

Dez anos depois da publicação da Resolução Conama 273/00 – que mudou as regras do setor de combustíveis ao determinar que todos os estabelecimentos e indústrias precisam adequar seus equipamentos de forma a garantir proteção ambiental –, o mercado ainda não conseguiu regularizar totalmente as suas estruturas e operações, contando, hoje, com menos de 50% dos postos do país adequados ambientalmente.   

A despeito de todos os esforços, a aplicação da lei sofre, principalmente, com a ausência de padronização de procedimentos que orientem os agentes envolvidos no cumprimento de todos os seus requisitos.  

Nesse aspecto, desde que foi lançado o desafio, a Cetesb, órgão ambiental paulista, foi uma das entidades que liderou todo o processo de adequação dos estabelecimentos no estado. Através da Câmara Ambiental de Comércio de Combustíveis Derivados de Petróleo e Biocombustíveis, foi responsável, inclusive, pelo desenvolvimento do arcabouço que deu origem à lei.  

Ricardo Shamá, que preside a Câmara Ambiental da Cetesb desde a sua fundação, há mais de dez anos, não tem dúvida que São Paulo é o estado com maior avanço em termos de controle técnico-administrativo do atendimento à Resolução Conama.  

       

PO  –  Dez anos depois da aprovação da Resolução Conama 273/00, o que mudou, de fato, para o setor?  

Shamá  –  Na prática, esta resolução representa um marco muito importante, pois uma atividade, no caso o Posto Revendedor de Combustíveis, PRC, que não fazia parte da lista de atividades licenciáveis na Resolução 237, passou a ser considerada como tal, ou seja, atividade potencialmente poluidora e, consequentemente, sujeita ao sistema de licenciamento ambiental.  

Este fato vem propiciando uma mudança de atitude de toda a revenda, visto que novos padrões de equipamentos foram estabelecidos e necessidade de maior atenção nas práticas operacionais  vêm sendo aplicadas, o que induz a preocupação de todos com a prevenção aos impactos ambientais possíveis da atividade de um PRC.  

  

PO  –  Apesar do avanço da indústria, as distribuidoras e seus revendedores ainda não conseguiram cumprir com as adequações ambientais.  Por quê? 

Shamá  –  O setor de revenda possui uma abrangência geográfica por todo o país.  Temos que considerar que a atividade da revenda existe há mais de 80 anos. Portanto, práticas passadas de padrões de equipamentos e instalações tiveram que ser adequadas de repente, com o advento desta resolução.  Além dos altos recursos financeiros, os postos tiveram que se adequar à nova realidade.  

Hoje são mais de 35 mil “sites” registrados na ANP e operando no país, o que demonstra a complexidade da questão.  Acreditamos que, no momento, mais de 50% da rede de postos já se encontram de acordo com esta resolução. 

  

PO  –  Em quais estados o processo está mais avançado? A que razões credita esse fato?  

Shamá  –  Sem dúvida, o processo começou por SP e RS.  Hoje, todos os estados do Sul e Sudeste avançaram bastante. Acreditamos que isto se deve a dois fatores: maior concentração de postos nesses estados e iniciativa dos órgãos ambientais dos mesmos. 

   

PO  –  A falta de padronização das exigências legais nos estados e municípios dificulta a elaboração de iniciativas nacionais. O que pode e vem sendo feito nesse sentido? São Paulo serve de exemplo? 

Shamá  –  A falta de padronização de procedimentos que orientem os revendedores na aplicação de todos os requisitos da resolução foi o maior desafio que teve o setor.  Com a iniciativa criada pela Cetesb, através da Câmara Ambiental de Comércio de Combustíveis Derivados de Petróleo, podem-se definir inúmeros mecanismos de comando e controle via procedimentos, em consenso com o setor e a Cetesb. 

Sem dúvida, o estado de São Paulo liderou este processo, desde o desenvolvimento do arcabouço que deu origem à referida resolução, através da Câmara Ambiental, até com os estabelecimentos de inúmeros procedimentos e definições de valores orientadores para contaminação de solo e água subterrâneas. 

Não diria que São Paulo serve de exemplo, pois cada estado deve buscar a melhor forma de implementar a referida resolução, segundo as suas características administrativas, legais, culturais e até geográficas.  

    

PO  –  O que dizer dos PAs que, praticamente, não iniciaram seu processo de adequação?  O que está sendo feito e o que poderia ser feito para que estes agentes sejam identificados, cadastrados nos respectivos órgãos e para que deem início à adequação? 

Shamá  –  Esta é uma questão desafiante para todos os envolvidos no setor de revenda. Os Pontos de Abastecimentos, PAs, representam uma parte da atividade de revenda, com grande capilaridade no país, pois representam aquelas atividades, comercial, industrial ou até pública, que precisam de combustíveis para consumo próprio em suas atividades. 

A grande dificuldade está na caracterização dessas atividades, pois, muitas delas também não faziam parte da lista de atividades potencialmente poluidoras da Resolução 237, e por esta razão, foram incluídas na Resolução 273.  Além disso, os PAs, na maioria dos “sites”, representam uma pequena parte de toda a instalação.  Esses dois fatores induzem  os  responsáveis legais dos “sites” a não terem muita atenção para a necessidade de se licenciar os PAs.  

  

PO  –  A gestão de resíduos também é um tema recorrente nos postos. O que é, de fato, responsabilidade da distribuidora e do revendedor? 

Shamá  –  A Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei 12.305 de 2 de agosto do ano passado, define as responsabilidades de todos os agentes envolvidos nas suas respectivas atividades.  Em linha geral, o empreendedor é o responsável por fazer a gestão de todos os resíduos gerados na operação.  Sendo os PRCs um empreendedor, estes devem implantar um sistema de gestão de resíduos em atendimento ao prescrito na referida lei. 

O que precisa ser bem definido é o tipo de resíduos gerados nas atividades dos  PRCs e quais são os agentes distribuidores dos mesmos.  Para cada agente, este naturalmente corresponderá com sua parte de responsabilidade no sistema de gestão dos resíduos sob a coordenação do empreendedor, no caso, o PRC.  Para tanto, a referida lei define a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, o qual envolve toda a cadeia produtiva, desde o fabricante, importador, distribuidor e comerciante, dos consumidores, até os titulares dos serviços públicos relativos a resíduos. 

  

PO  –  Em que estágio se encontra a coleta e a destinação adequada de embalagens de lubrificantes, por exemplo?  Já foi iniciada em todo o país, em todo o tipo de estabelecimento que comercializa esse tipo de produto? 

Shamá  –  Para o caso específico de resíduos de embalagens de lubrificantes as entidades representantes dos principais agentes envolvidos – fabricantes e revenda – já iniciaram a implantação de um projeto de logística  reversa de coleta de embalagens usadas, em que as partes envolvidas, fabricante e distribuidoras e revenda têm os seus respectivos papeis.  É o Programa Jogue Limpo, que já se encontra implantado nos estados de RS, SC, PR, RJ e no município de São Paulo,  e procura essencialmente coletar as embalagens de lubrificantes nos PRCs e concessionárias de automóveis.  

  

PO  –  Acha possível manter essa cultura ambiental após a regularização dos  estabelecimentos, mesmo a custos elevados? 

Shamá  –  A questão em si está muito relacionada ao principio de educação e maturidade das pessoas que fazem os negócios.  Hoje podemos ver que muito postos já procuram atender os requisitos da 273, não só por ser uma exigência legal, mas também por convicção da necessidade de se preservar o meio ambiente.  Podemos perceber que esta atitude está muita vezes relacionada com a cultura da região verso os interesses econômicos.  O que percebemos, é que o processo de adequação e a Política de Resíduos é irreversível, por se tratar de uma exigência de todos que fazem à sociedade em si, no sentido de preservar o meio ambiente em que se vive.