Tudo indica que o setor sucroalcooleiro já ingressou em um novo ciclo virtuoso de produção, com a retomada do ritmo normal de renovação das lavouras de cana e o aumento da produção de etanol.

Em evento ocorrido na Espanha recentemente, a presidente Dilma Rousseff declarou acreditar num “novo surto de investimentos” no setor, com aumento da produtividade, o que é corroborado pelas palavras de Antonio de Pádua Rodrigues, presidente interino da Unica, nesta entrevista. Ele aponta para a evolução da produção e da produtividade dos canaviais, para a busca por crédito para renovação das culturas, mas diz que o setor deseja a definição de regras claras, de longo prazo, para a participação do etanol na matriz brasileira de combustíveis.

Posto de Observação – Conforme previsto no final de 2011, este ano houve renovação, ainda que parcial, das áreas de cultivo?

Antonio de Pádua Rodrigues – Em virtude das dificuldades financeiras por que passava o setor, provenientes da crise internacional que eclodiu em 2008, o índice de renovação das lavouras de cana-de-açúcar em 2011 situou-se entre 7% e 8%, aquém do ideal, que é entre 18% e 20%, com influência negativa sobre a produtividade da matéria-prima. Já em 2012 ocorreram grandes investimentos do setor e, com isso, a renovação das culturas deverá atingir os índices normais, com reflexos positivos já nesta safra, de 2012-2013, e incremento da produção nas próximas.

PO – No ano passado comentava-se que apesar de o Governo ter oferecido linhas especiais de crédito para a renovação das áreas de cultivo e a formação de estoques de etanol, poucos produtores conseguiam ter acesso a esse crédito, dadas as exigências. Algo mudou nesse sentido?

Pádua – Consideramos muito positiva a iniciativa do Governo, de oferecer uma linha de crédito específica, por meio do BNDES, para a renovação das lavouras. Neste primeiro ano, conseguimos superar as dificuldades geradas por essa nova forma de relacionamento do setor produtivo com os bancos e poderá ser atingida cerca de 50% das metas de financiamento. A previsão é de que no próximo ano sejam obtidos resultados ainda mais positivos.

P.O. – Em comparação com a safra 2011-2012 a atual apresentará expansão na produção de etanol? Que fatores contribuem para isso?

Pádua – Nesta safra, 2012-2013, haverá pequeno incremento na produção de cana-de-açúcar, de aproximadamente 2,5% em relação à passada. Em 2011-2012 a produção do Centro-Sul foi de 494 milhões de toneladas e na atual a estimativa é que se atinja 518 milhões de toneladas. Quanto ao etanol, na safra anterior foram produzidos 20,54 bilhões de litros e nesta a previsão é de que a produção seja de 21,05 bilhões de litros (8,3 bilhões de litros de anidro e 12,75 de hidratado). Esse aumento da produção se deu especialmente em virtude da recuperação da produtividade da cana, causada por condições climáticas mais favoráveis: em 2011-2012 a produtividade foi de 64 toneladas de cana por hectare plantado, enquanto que na atual essa média subiu para 75 toneladas por hectare.

PO – O número de usinas e destilarias cresceu nos últimos anos?

Pádua – Na verdade, ocorreu redução no número de unidades produtoras, com a paralisação das atividades em 41usinas e destilarias. No entanto, na safra passada três novas entraram em funcionamento e, na presente, duas estão em testes para começar a produzir.

PO – Mantido o quadro atual de produção, custos e preços, o que o mercado consumidor pode esperar para 2013 com relação ao etanol?

Pádua – O incremento da oferta de etanol, tanto anidro quanto hidratado. O setor espera que em 1º de junho de 2013 o Governo eleve dos atuais 20% para 25% a participação do etanol anidro na composição da gasolina. Esse aumento de 5% deverá ser suportado pela elevação da oferta de matéria-prima na safra 2013-2014, que deverá superar o patamar de 556 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, atingido em 2010-2011. A estimativa é de produção adicional de 2 bilhões de litros de etanol anidro e de 2 bilhões de hidratado. Quanto aos preços, cabe ao mercado encontrar o equilibro.

P.O. – Acredita que no curto, médio, prazo, com o inevitável aumento dos preços dos derivados do petróleo – notadamente a gasolina –, a tendência é de haver mais equilíbrio nos preços e elevação da demanda por etanol?

Pádua – O potencial da demanda no país está dado. No estado de São Paulo, no qual a alíquota de ICMS é mais baixa, o etanol é competitivo, seguido por estados como Paraná, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, entre outros, em que o produto também goza de algum benefício tributário. Recentemente, buscando estimular o consumo, a Única lançou a campanha Etanol, o combustível completão, que conta com a participação de postos, na qual procura reavivar a memória do consumidor sobre os pontos positivos do uso do etanol, como a redução de emissões, a geração de empregos e o fato de ser um combustível genuinamente brasileiro.

A elevação da demanda por etanol vai depender da atitude do consumidor e também da adequada precificação da gasolina. Se houver esse aquecimento, maior volume de cana poderá ser direcionado à produção do etanol ombustível, já que deverá haver retração no consumo de gasolina e do etanol anidro que a compõe.

PO – O Governo tem sinalizado o setor com a perspectiva de uma política de longo prazo para os combustíveis e, dentro disso, a definição do papel a ser desempenhado pelo etanol?

Pádua – O Governo já sinalizou que pretende manter o etanol na matriz, mas deverá haver definição mais clara sobre como deverá se dar essa participação, levando em conta o estabelecimento de uma política interna para os preços dos combustíveis. No cenário atual temos frota de veículos e demanda por combustíveis crescentes e, por outro lado, a limitação na capacidade de produção de derivados de petróleo nas refinarias. Os caminhos de curto prazo são ou a recuperação do papel do etanol hidratado na matriz, ou o aumento da importação da gasolina, para complementar a oferta interna do produto. Outra solução, num prazo mais longo, seria a construção de novas refinarias.

PO – Hoje, na visão da Unica, além da prática de preços reais para a gasolina, o que é necessário para que a produção de etanol volte a crescer?

Pádua – Precisamos de regras claras, de longo prazo, que permitam a convivência pacífica do etanol hidratado com a gasolina, que garantam, por exemplo, a isonomia de condições para os dois combustíveis, preços competitivos e a adequada remuneração do produtor. Este precisa estar seguro de que o crédito tomado para a expansão da produção – algo entre US$ 100 e US$ 120 por tonelada de cana – poderá ser saldado dentro do prazo, que pode ser de 20 anos, mesmo levando em conta os riscos inerentes à atividade agrícola.

O Governo teme os reflexos do aumento dos preços da gasolina (e do diesel) na inflação, mas é preciso encontrar uma saída que permita a correção desses preços com um mínimo de impacto sobre esses índices. O consumidor brasileiro, diferentemente do de outros países em que os preços na bomba variam de acordo com as oscilações dos preços internacionais, está acostumado com a estabilidade.

Para a convivência dos dois produtos um caminho é a desoneração tributária do etanol e tratamento isonômico. Por exemplo, este ano, ao eliminar da gasolina os R$ 0,28 referentes à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), o Governo causou perda de competitividade do etanol hidratado na bomba da ordem de R$ 0,17.