Há um ano e meio à frente da Companhia de Gás de São Paulo, Comgás, Luis Henrique Guimarães se diz fascinado por todos os desafios e oportunidades proporcionados pela indústria do gás natural. O executivo, que assumiu a presidência da maior distribuidora de gás canalizado do país no mesmo momento em que a Cosan adquiriu 60,05% de seu capital social, em maio do ano passado, credita o fracasso da sua utilização como combustível automotivo por uma legítima falta de interesse e política governamental efetiva. Porém, apesar da pouca tradição brasileira no uso do gás natural canalizado e representatividade que não ultrapassa os 10% na matriz energética, o produto, em sua opinião, tem enormes possibilidades de crescimento, inclusive, para uso automotivo. “Não há como, um produto que é 50% mais barato que os seus concorrentes, não crescer. Estamos trabalhando para o futuro desse mercado ser promissor”, garante. Acompanhe a entrevista concedida à Revista PO. PO – Ao assumir a presidência da Comgás, quais são seus maiores desafios? Guimarães – Passei os primeiros meses conhecendo os detalhes do mercado de gás natural. Estou fascinado por essa indústria que tem tantos desafios e oportunidades. O Brasil tem pouca tradição no gás natural canalizado e há enormes possibilidades de crescimento. Cerca de um quarto de toda a energia consumida no mundo é a partir do gás natural, mas, no Brasil, a participação do GN na matriz energética do país é de 10%. O mercado de GNV (Gás Natural Veicular) é dos mais empolgantes, pois traz grandes vantagens econômicas ao usuário. Um carro que usa GNV gasta cerca de 50% menos por km rodado do que gastaria rodando com gasolina ou etanol. PO – Quais são os projetos para incremento no setor de GNV? Guimarães – Estamos com projetos em andamento nos segmentos de táxi, frota e profissionais autônomos que utilizam o veículo como ferramenta de trabalho. Um deles tem a parceria com concessionárias de veículos 0 km que já ofertam o veículo novo com kit GNV, mantendo a garantia do mesmo. Consideramos que este caso é inovador no mercado, pois elimina a barreira referente a garantia e burocracia da documentação do veículo. Outra contribuição para este segmento é que conseguimos, junto à Secretaria de Fazenda, a revisão do MVA (margem de valor agregado), que trouxe como resultado prático a redução de R$ 0,13 do preço do GNV da Comgás para o posto a partir de 1º de agosto, que representou decréscimo de 10,48% no preço. PO – Vê um futuro promissor para o gás natural automotivo no Brasil? Por quê? Guimarães – Sim, acredito e estamos trabalhando para o futuro desse mercado ser promissor, sem dúvida. Para os veículos leves, a economia na comparação com etanol e gasolina é de cerca de 50% na área de concessão da Comgás. Além disso, há o ganho ambiental, pois as emissões provenientes da queima do GNV são menores, e a indústria automotiva está apostando no carro a gás. Aqui no Brasil, a Fiat já oferece, de fábrica, o modelo Siena a GNV. Em outros países, como EUA, Alemanha e Itália, a oferta de veículos movidos a GNV já é uma realidade consolidada pelas montadoras. PO – A que se deve a forte queda nas conversões e vendas nos últimos anos? Guimarães – Na minha avaliação esse mercado sofreu uma crise de confiabilidade quando o próprio governo federal, no final de 2007, foi para a TV dizer que o gás não era para abastecer veículos. Esse pronunciamento infeliz para o mercado de GNV foi feito em um contexto de risco de fornecimento do gás boliviano, com ameaça de suspensão do fornecimento para o Brasil. Hoje a situação de suprimento de gás natural no Brasil é muito diferente daquela época. Mas os reflexos existem até hoje. É fundamental para o empresariado a clareza e a manutenção das regras. E isso é muito sério e tem que lembrar que há toda uma cadeia por trás desse negócio. Somente aqui em São Paulo esse mercado emprega diretamente mais de 5 mil pessoas entre fabricantes de cilindros, de kits de conversão, suporte, além de 96 instaladoras de GNV homologadas pelo Inmetro, postos de combustíveis e organismos de inspeção veicular. PO – Acredita que o aumento do preço dos combustíveis, quando acontecem, impulsionam o GNV de alguma maneira? Guimarães – O mercado de GNV não é assim tão flexível como utilizar gasolina ou etanol, pois o carro precisa ter o kit instalado, e esse kit moderno, de quinta geração, custa entre R$ 4 mil e R$ 5 mil. A gasolina e o etanol teriam que baixar muito para fazer frente ao custo do km rodado a GNV. E a tendência é de alta de preço na gasolina, se considerarmos a grande defasagem deste produto em relação ao preço internacional e à recente desvalorização do real. PO – Há, afinal, uma política para inserir o gás natural automotivo na matriz energética brasileira? Guimarães – Estamos realizando um grande trabalho para inserir o GNV de forma mais firme e sustentável com ações junto ao estado e também no âmbito federal. Hoje não existe qualquer incentivo para a indústria automobilística produzir o verdadeiro carro flex no Brasil (GNV, etanol e gasolina). O GN é o único combustível da matriz brasileira que não sofreu qualquer tipo de desoneração de impostos nos últimos anos. A gasolina e diesel zeraram a Cide, o etanol zerou o Pis e Cofins, o GLP não sofre aumento na refinaria desde janeiro de 2003. O imposto pago pelo GNV é de 35%; o do etanol é 21,87%, o do diesel é de 23,03 (S50) e 23,39% (S500). É clara a distorção. Além dessa questão do imposto sobre o combustível, estamos trabalhando na redução do IPVA e IPI para os veículos 3 flex (GNV, gasolina, etanol). PO – A malha de distribuição do gás natural tem condições de atender aos postos de combustíveis nas regiões em que a Comgás atua? Guimarães – Hoje temos uma das maiores redes de distribuição de GNV do país localizada em regiões e rodovias estratégicas de São Paulo, são quase 10 mil km de rede na área de concessão da Comgás. São Paulo possui umas das maiores infraestruturas de postos e oficinas instaladoras de GNV do país, além de ser o estado que mais utiliza o kit de última geração. O que faremos é analisar melhor em conjunto com a Arsesp os novos pleitos de abertura de novos postos com o intuito de consolidar com mais eficácia o GNV em regiões demandantes. Em 2013, a rede da Comgás crescerá 1000 km e junto chegaremos a mais municípios da região. PO – Tem notícia da atuação de outras distribuidoras no estado e/ou no país? Guimarães – Sim, acompanhamos muito de perto, principalmente o mercado de GNV do RJ, que é nossa referência. Lá, os carros a GNV têm incentivo no IPVA, que é o que estamos buscamos aqui para o estado de São Paulo. O resultado desse incentivo é que 85% da frota de táxi utiliza o GNV. Em São Paulo, de uma frota de 35 mil táxis, cerca de 8 mil utilizam o GNV. Há muito espaço para avançar. PO – O que dizer aos donos de postos de abastecimento de GNV que apostaram no combustível e agora não têm demanda para o produto? Guimarães – Para voltarem a acreditar no combustível, promover a vantagem de custos para os seus clientes, instalar os placares de preços disponibilizados pela Comgás e motivar os seus frentistas a indicarem a instalação de kits para seus clientes. A maioria dos postos que atuam em SP viveram os bons momentos do GNV e sabem dos benefícios do produto e o potencial que existe no mercado. As ações da Comgás refletirão não somente para os postos, mas para toda a cadeia do GNV, fabricantes de cilindros, kits, instaladoras e acreditamos que cada empresa da cadeia contribuirá na reconquista deste mercado. PO – O que dizer aos donos de postos de combustíveis que pensam em investir neste combustível? Guimarães – Estamos muito comprometidos em trabalhar para recuperar esse mercado. Há muitas frentes de atuação, tanto na parte de redução de carga tributária, como de entraves mais técnicos e comerciais. Esse mercado tem todas as condições de crescer. Não há como um produto, que é 50% mais barato que os seus concorrentes, não crescer.