Por Elaine Paganatto


 



Quem já não parou diante de uma barca lotada de peixes crus e ficou impressionado com os detalhes que se misturavam à comida? São pássaros feitos de cenoura, berinjelas que se transformam em tucanos e flores moldadas com fatias de peixes das mais variadas qualidades. Artesanal e adornada, a comida japonesa chega à mesa com um colorido impressionante que enche a boca de água e os olhos de admiração.


Mas não pense que é fácil ornamentar um prato com tantas alternativas visuais e ainda torná-lo agradável ao paladar. É preciso técnica, somente adquirida após anos e anos de experiência com um facão nas mãos. Os cursos que formam um sushiman levam no mínimo três anos e, mesmo assim, ensinam somente o básico.


Júlio Ogawa, um dos sócios do restaurante Hiroshi**, em Santana, Zona Norte de São Paulo, afirma que só se consegue a habilidade e know how após uns 10 anos de experiência. “Os cursos são como as faculdades, ensinam cerca de 20% do que é preciso e o restante se aprende com a prática no dia-a-dia”, observa.


Segundo Ogawa, para que conseguisse deixar as peças no tamanho e grossura ideais, sem deixá-las perder o sabor e a textura, foi necessário cortar de 20 a 30 quilos de peixe por dia. Hoje, ele se considera pronto para agradar a todos os públicos, do tradicional ao mais eclético.


Filho de imigrantes, Ogawa foi o primeiro da família a se dedicar ao preparo da comida, aos 12 anos de idade. Trabalhou 14 anos como funcionário e há 11 abriu com o irmão Francisco Ogawa seu próprio negócio. Aprendeu as técnicas da culinária oriental com cozinheiros que vinham do Japão para ensinar no Brasil.


Nessa época, a comida japonesa ainda não era tão apreciada quanto nos dias atuais.  Hoje, o número de restaurantes triplicou, em função de as iguarias orientais terem caído no gosto do público. Jovens, idosos e crianças se misturam nos salões degustando pratos frios e quentes.


Antes desse boom da comida japonesa, os pratos eram preparados à moda tradicional, em que se usavam praticamente sempre os mesmos produtos. No entanto, para atender à demanda, o sushiman teve de inovar na elaboração dos pratos. Deixou de lado o tradicionalismo, em que não se utilizavam maioneses, cream cheese, enrolados fritos etc., -mas apenas peixes crus e arroz -, para incrementar com esses ingredientes. “As pessoas querem novidades, sempre”, diz Ogawa.


O corte das peças também é um fator importante para que o sushiman faça sucesso com seus preparados. As fatias devem ser grossas para que sejam mastigadas, o que permite sentir o sabor e a textura do peixe. As fatias finas, por sua vez, absorvem muito shoyu e deixem o sabor se perder na boca.


 


Sabor do alimento


 


Ao contrário do Brasil, no Japão os restaurantes não oferecem diversidade, são específicos. Quem quiser comer sashimi (fatia de peixe cru), por exemplo, vai a um que sirva sashimi. Aquele que preferir sushi (arroz com uma fatia de peixe cru) vai ao que sirva sushi. Não há a variedade que temos aqui, quando encontramos num mesmo restaurante temakis (que levam algas), sushis, sashimis, legumes empanados, entre outras guloseimas.


Abrasileirar os restaurantes não foi um fato isolado. Foi abrasileirada também a maneira de comer. O oriental nunca mistura a wasabi (raiz forte) no shoyu. Ele a coloca sobre o peixe (no caso do sushi) e este, sim, é passado no molho e não o arroz.  “Nunca se molha o arroz. O japonês gosta de sentir o sabor do alimento e não o do tempero. O brasileiro é que está acostumado às comidas temperadas”. Júlio salienta ainda que o correto é que o sushi seja pego com a mão e não com hashi (palitos). Outra coisa: não se mistura gengibre à comida. Ele serve apenas para “limpar” o paladar de um outro peixe que se tenha comido antes. Com certeza, mesmo os freqüentadores assíduos já devem ter cometido esses pecados à mesa ou no tatami, que seja. Agora, quer ofender mesmo um japonês? Corte o sushi ou qualquer outro petisco que você julga não caber na sua boca. Seja do tamanho que for a peça tem de ser comida inteira.


Mas e essa história de que existe diferença no sabor da comida ao usar o fooku (garfo) ao invés do hashi? Saiba que não é densetsu (lenda). O sabor do metal, de fato, se transfere para a comida. Por isso, os orientais usam somente objetos de madeira, inclusive pratos e copos.


Porém há um outro motivo para comer com hashi, que não somente o fato de ele ser de madeira. “A principal razão do uso do hashi é que, com ele, você é obrigado a olhar para a comida, pois é impossível conversar e pegá-la com os palitos sem olhar o que se está fazendo. Isso o faz apreciá-la, já que há um efeito visual na degustação. O que não ocorre quando se come com garfo, cujo movimento de pegar a comida e levar à boca é automático”.


Portanto, quem ainda não aprendeu a usar o hashi, trate de fazê-lo, ainda que seja com elástico na ponta - como os que se vêem nos restaurantes -, que ajudam os iniciantes na técnica.


Agora, se você já estiver dominando com o hashi na mão, então, omedetoo gozaimasu***!


   


*Bem-vindo


 ** Há mais de 10 maneiras de uma mesma palavra ser escrita em japonês. Da forma como está grafada na fachada do restaurante Hiroshi quer dizer visão ampla.


***Parabéns